Nos últimos anos, temos vivenciado um avanço tecnológico sem precedentes. Computadores estão em todos os lugares, cada vez mais rápidos. Nossos celulares são mais poderosos do que supercomputadores de duas décadas atrás. Nossos carros já são inteligentes e habilidosos o suficiente para cumprir tarefas dispensando a habilidade humana.
Todo o avanço percebido na tecnologia, entretanto, de maneira frustrante, não está sendo observado em qualquer indicador relevante de produtividade – como o PIB das principais nações. O que se percebe, na maior parte dos casos, é estagnação ou, pior, desaceleração. Seguramente, algo não está certo!
A fórmula da produtividade No meio corporativo é comum falar sobre o “desafio da produtividade”. Mas, você já parou para pensar no que ser mais produtivo, de fato, significa? |
'Como a economia funciona?' com Ray Dalio Em um vídeo de apenas 30 minutos, Ray Dalio explica o que é a economia e como ela funciona. Fundamental! |
Há diversos estudos que apontam que o poder de compra das pessoas vem reduzindo e não aumentando. O que é completamente contrário a perspectiva da tecnologia nos direcionando para abundância.
Em termos simples, estamos mais tecnológicos, mas não estamos mais produtivos e, em consequência disso, o impacto na qualidade de vida das pessoas é questionável. Sobre muitos aspectos, estamos apenas fazendo diferente o que já fazíamos. Algo muito diferente do que deveria ser a inovação.
As três capabilities da inovação
De maneira estruturada, podemos decompor as atividades relacionadas a inovação em apenas três capabilities distintas. São elas: descoberta, disseminação e absorção.
As atividades vinculadas a descoberta estão relacionadas tanto com as atividades de criação de novas técnicas e tecnologias, quanto em pesquisas disciplinadas sobre o que há de novo. Na prática, é onde deveriam se concentrar os esforços relacionados aos investimentos de pesquisa e desenvolvimento (R&D) e não em esforços de manutenção da continuidade, como na evolução incremental de sistemas potencialmente legados.
Os esforços para disseminação implicam em atividades para comunicar técnicas e tecnologias, que já foram explicitadas na descoberta. A ideia principal é mitigar resistências ao novo e facilitar a mudança.
A estratégia mais comum para a mudança é não mudar.
Peter Drucker |
Todas as atividades relacionadas a disseminação objetivam familiarizar – explicando e instruindo – e facilitar – apoiando o uso – o novo para os potenciais agentes de transformação.
Finalmente, a absorção tem relação com a aplicação efetiva de técnicas e tecnologias descobertas e disseminadas. É na absorção que a inovação, de fato, se realiza, pois é ela que tangibiliza resultados.
Menos criatividade, mais inovação
O descompasso entre o avanço tecnológico e o aumento da produtividade fica fácil de entender quando percebemos que há, também, descompasso nas nossas capacidades para criação de tecnologias e a subsequente disseminação e absorção destas. Como sociedade tecnológica, poucos criam muito, alguns (entusiastas) disseminam razoavelmente, enquanto raros absorvem muito pouco.
Assistentes virtuais como as ofertadas pela Google, Amazon e Apple poderiam fazer muito mais do que fazem hoje. Imagine, por exemplo, salas de conselho devidamente equipadas de assistentes virtuais, capazes de responder instantaneamente questões importantes sobre o negócio utilizando informações quentes. Pois bem, tal cenário é prático, fácil de aplicar, mas ainda bem raro na realidade. Ou seja, já criamos, mas ainda não inovamos.
Celebramos os resultados de empresas como a Amazon, Tesla e a Alibaba, mas investimos pouco ou nenhum esforço disseminando e aplicando seus avanços como alternativas para as capabilities que suportam nossos modelos de negócios e operacionais.
A superação da era da escassez e o advento da abundância prevista por futuristas, como incentivo, depende de mais inovação e, talvez, um pouco menos de criatividade. Ou seja, mais do que criar ou disseminar novidades, sistemativamente, explorar todo potencial “represado” das tecnologias já conhecidas para impactar os negócios.
A urgência da revisão dos modelos de negócio e operacionais
O paradoxo de Solow, indicado na citação que abre o capítulo, foi parte de uma constatação do economista Robert Solow para o fato de que, na década de 1980, as empresas estavam investindo pesado em tecnologia sem aparente compensação.
A problemática, observada por Solow, é de que pouco adianta investir em computadores sem, antes, adaptar processos e práticas para fazerem bom uso deles. Esse fato também é verdade para tecnologias em geral.
A limitação produtiva que observamos hoje somente será superada com o desenvolvimento de novos modelos de negócios e operacionais. Ou seja, no lugar de achar formas ótimas de fazer o que já é feito, temos que definir capabilities em termos completamente novos.
Novas tecnologias podem permitir que as organizações façam coisas novas, em vez de apenas melhorar o que foi feito antes.
Tim O'Reilly |
Superando o desafio da produtividade com inovação
O caminho para a produtividade é intensificar esforços para disseminação e, sobretudo, de absorção tecnológica nos modelos de negócios e modelos operacionais. Algumas poucas startups estão se convertendo em unicórnios rapidamente observando esse princípio. De qualquer forma, temos que remover o místico ou mágico na competência para inovar de maneira efetiva.
Qualquer tecnologia suficientemente avançada é indistinguível de magia.
Alan Clarke |
Honestamente, penso que a romantização da tecnologia, na maioria dos casos, é argumento incompetente para a falta de capacidade de transformar conceitos em resultados.
A urgência pela inovação aberta
Nenhuma empresa é capaz de monopolizar as “boas ideias” de seus setores de atuação. Por isso, independente do quanto sejam efetivas – na descoberta, disseminação e aplicação de tecnologias – precisam se engajar profunda e extensamente com conhecimentos e competências externas. Daí a importância de modelos de atuação baseados em inovação aberta.
Inovação aberta é uma “abordagem distribuída” que tenta ampliar a gestão do conhecimento “afrouxando” os limites da organização.
A analogia a usar é a de um “funil vazado”, aberto ao extremo para facilitar a descoberta de tecnologias e ideias. O fluxo dentro desse funil é intenso, inicialmente, mediante ações de familiarização e facilitação – disseminando a potencial inovação – para, finalmente, culminar na absorção que irá gerar resultados diferenciados para o mercado e, consequentemente, para o negócio.
A ideia é que o fluxo de inovação aconteça de fora para dentro (outside-in) ou de dentro para fora (inside-out).
O fluxo Outside-In implica que empresas abram seus processos – relacionados a descoberta, disseminhação e absorção – para que eles sejam permeados por agentes externos à organização, facilitando contribuições. Destacam-se, em abordagens outside-in iniciativas como opensourcing e crowdsorcing.
O fluxo Inside-Out, compete a organização permitir que conhecimentos não utilizados ou subutilizados saiam da organização de forma que outros possam se beneficiar. Isso pode ocorrer sob alguma forma de licenciamento, colaboração em projetos abertos, ou ainda na formação de novas joint-ventures.
Para pensar…
É necessário equilibrar o crescimento exponencial dos recursos tecnológicos e a produtividade. Essa é justificativa, mais do que razoável, para iniciativas de transformação digital e ágil.
Há muito potencial reprimido, amplamente disponível, para organizações de todas as naturezas. Empresas podem fazer muito mais com celulares, computadores e assistentes pessoais do que fazem hoje. Há muita “complexidade predatória” esperando para ser removida. Há muitas rupturas importantes por serem articuladas em modelos operacionais e de negócios.
Processos de adoção de tecnologias demandam gestão eficiente da inovação, o que implica no desenvolvimento das três capabilities essenciais: descoberta, disseminação e absorção e dado mundo VUCA em que vivemos, isso precisa acontecer de maneira aberta. Não há outra alternativa viável em longo prazo!